Por: Helena Degreas
A implementação do sinal 5G em algumas capitais é o primeiro passo para a melhoria na qualidade dos serviços públicos e para a gestão sustentável da infraestrutura urbana. Como isso acontece? Maior rapidez e estabilidade do sinal permitem a adoção do conceito de IoT (Internet das Coisas), que viabiliza o funcionamento de tecnologias e equipamentos que conectam objetos físicos e virtuais de qualquer aparelho eletrônico à internet por meio de um Endereço de Protocolo da Internet (Endereço IP), uma espécie de registro do aparelho. No mundo, cerca de 55% dos habitantes moram em cidades e, no Brasil, aproximadamente 85% da população (PNAD 2015). Para fornecer os serviços públicos demandados por essa imensidão de gente nas áreas de transporte, consumo de água, coleta de lixo, manutenção de áreas públicas e iluminação viária, prefeituras trabalham com receitas escassas provocadas pelo pífio crescimento econômico resultante tanto dos impactos negativos provocados pela Covid-19 quanto pela medíocre gestão em todas as áreas de atuação federal associadas ao presidente em exercício. Como fornecer os serviços básicos aos cidadãos de maneira equitativa e eficaz em toda a cidade? Estimativas da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) apontam que a tecnologia 5G só deve chegar a toda a população distribuída nos 5.568 municípios apenas em 2029. Para atender a todos, será necessário quintuplicar o número de antenas existentes. Comunidades rurais, indígenas, quilombolas e aqueles que sequer tem acesso ao sinal 2G, 3G e 4G (nas cidades esse fato é realidade comum, infelizmente) ainda terão de amargar a espera pela instalação e funcionamento da rede por mais alguns anos. Dito de outra forma: a aceleração na implantação da infraestrutura tecnológica que levará à inclusão social por meio do acesso à comunicação, informação e serviços públicos, ainda não é tratada como prioridade para governos, deixando parte dos brasileiros literalmente sem acesso ao que acontece no mundo hoje.
Utilizando os recursos tecnológicos disponíveis para agilizar operações, gerenciar e disponibilizar publicamente o banco de dados resultante não apenas para entender as necessidades específicas de cada território, distrito, bairro e rua, mas também, para garantir a transparência das informações referentes à governança pública, é o que os cidadãos precisam cobrar dos gestores eleitos se quiserem decisões políticas centradas no bem-estar das pessoas. Embora eu esteja me referindo à atuação municipal nesta coluna, espero que o leitor procure na plataforma de governo (promessas de campanha) do seu candidato, o que ele tem a dizer sobre a ampliação do acesso às tecnologias digitais e de rede em seu mandato visando a inclusão de todos os brasileiros. Em 2020, foi lançado o programa da ONU-Habitat “Cidades Inteligentes Centradas nas Pessoas” (tradução livre), que relacionou os conceitos de sustentabilidade e tecnologias digitais ao poder transformador para o desenvolvimento de ecossistemas de serviços públicos urbanos. Ainda no mesmo documento, o texto afirma que as cidades necessitarão elaborar políticas internas de direitos digitais para enfrentar as metas do desenvolvimento sustentável (Agenda 2030) e viabilizar governos abertos, transparentes e colaborativos centralizando seus esforços no atendimento às demandas por serviços e infraestruturas públicas que gerem bem-estar e qualidade de vida do cidadão por meio da garantia:
- De acesso universal e igualitário à internet e à alfabetização digital;
- Da qualidade por meio de padronização de serviços digitais com códigos abertos e éticos para que todos possam utilizar as tecnologias à sua escolha mantendo a equidade de interoperabilidade, inclusão e oportunidade. Às prefeituras, caberá a definição e implantação de suas próprias infraestruturas tecnológicas e legais para cumprimento desta meta.
- À privacidade, proteção de dados, segurança e controle sobre as informações pessoais do cidadãos garantindo a confidencialidade, anonimato, segurança incluindo o direito de saber quem os usa e com qual finalidade.
- Da capacidade coletiva da população de se envolver com os assuntos da cidade colaborativamente por meio de processos digitais abertos, participativos (também na forma presencial em locais definidos pelo poder público) e transparentes na formulação de políticas municipais e locais que visem ao bem comum atendendo os princípios da democracia participativa, da diversidade e da inclusão.
Dos 174 países avaliados pelo IESE Business School, University of Navarra, index 2020, o Brasil participou com cinco cidades: Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo, que ficou em primeiro lugar no ranking das cidades brasileiras cujas políticas públicas vêm incentivando o desenvolvimento de tecnologias da informação e comunicação no âmbito da prestação de serviços públicos associadas à interação em tempo real dos cidadãos como colaboradores no processo de gestão urbana nas seguintes dimensões: governança, planejamento urbano, tecnologia, meio-ambiente, mobilidade e transporte, projeção e conectividade internacional, coesão social, capital humano e a economia. A cidade de São Paulo encontra-se na 123ª posição, graças à avaliação ruim aferida à dimensão coesão social (156ª: justificada pela segregação socioespacial que se materializa na paisagem urbana), tecnologia (139ª a despeito dos avanços nos últimos anos, a falta de cobertura na oferta de sinal nas redes móveis 2G, 3G, 4G e 5G é vergonhosa ampliando a situação de segregação e exclusão da maior parte da população trabalhadora que mora distante das áreas centrais), sendo salva pela dimensão Projeção Internacional (41ª) e planejamento urbano (76ª).
Exemplos de melhorias que podem ser aplicadas aos serviços públicos urbanos não faltam: instalação de sistemas de monitoramento que identificam vazamentos nas tubulações que distribuem água; uso dos aplicativos móveis para o pagamento de transporte público associados à conteúdos que melhorem a experiência do usuário durante o trajeto; postes inteligentes dotados de infraestrutura que não apenas ajuste a iluminação pública adequando-a aos níveis de iluminação ao longo do dia mas também, às necessidades personalizadas de eventos públicos locais. Munidos de câmeras inteligentes, eles serão capazes de detectar sinistros e incidentes que acionarão os serviços públicos de emergência e segurança quando necessário. Os dados coletados destas situações, a longo prazo, irão colaborar na compreensão do problema, levando a soluções que podem antecipar e evitar problemas. Isto sem falar das tecnologias cívicas que, diferentes das colaborativas, permitirão maior engajamento do cidadão nas questões relativas à melhoria dos serviços públicos. Desenvolverei o assunto em nova coluna. O sucesso na aplicação do potencial transformador propiciado pelo sinal estável e mais rápido da rede 5G, quando associado à Internet das Coisas (IoT), à geração de dados e ao poder de análise pelo uso de Inteligência Artificial na solução dos problemas cotidianos do cidadão depende da prioridade dada à produção de tecnologias digitais colaborativas que propiciem a necessária interação ente o Estado, a população e as empresas, situação essa, que viabilizará o desenvolvimento urbano sustentável e o cumprimento das metas ambientais e sociais.
Reprodução de JP News